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Tem dias...

Hoje despertei em desalinho — como se o sol tivesse se esquecido de me combinar com o dia. Me vesti com minhas contradições e fui brigar comigo no espelho. As certezas que eu criava com tanto zelo se esconderam debaixo da cama, com medo do meu novo jeito de pensar errado. Há manhãs em que o coração acorda tropeçando, e os pensamentos, bêbados de sombra, não se entendem nem por compaixão. Costumo perdoar esses dias. Mas hoje não: hoje o não-bem me pesa como pedra molhada. Não é justo dizer que tudo bem quando o peito amanhece desabitado. Meu coração virou um quintal de tambores, batendo fora do ritmo. Minha cabeça, um formigueiro desarrumado, depois que um tamanduá de ideias veio fazer visita sem ser chamado. E eu, perdido entre os dois, não sei mais quem comanda quem. Tô cansado e desperto, manso e em guerra. Fecho os olhos e, no escuro das pálpebras, o cinema da minha mente projeta seus delírios — filmes que não pedi pra assistir, mas que insistem em me estrear.

Educação. A aprovação de faz de conta

O professor hoje é pressionado de forma absurda a aprovar. Não importa se o aluno não tentou, não se esforçou, não aprendeu o mínimo necessário. A ordem é clara: passe de qualquer jeito. E se não der, finja que deu. A família cobra, a instituição empurra, a sociedade aplaude. Afinal, pra que exigir compromisso? Agora imagine esse mesmo raciocínio em outras profissões. Um engenheiro ergue um prédio sem cálculo, sem estrutura — se cair, paciência, o importante é ter tentado. Um advogado faz uma defesa pela metade — se um inocente for condenado ou um criminoso escapar, tudo bem, ele fez “o possível”. Um médico olha o paciente por cima, receita qualquer coisa e diz que investigar demais é exagero. Um dentista, diante de uma cárie, simplesmente arranca o dente inteiro. Um psicólogo escuta cinco minutos, dá um conselho de revista e encerra a sessão. Um pedreiro assenta meia dúzia de tijolos e deixa o resto no chão, porque também não pode se desgastar. Uma manicure lixa só metade da unha e di...

A verdadeira condenação é nossa

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A condenação de Bolsonaro diz muito mais sobre nós, enquanto sociedade, do que sobre ele. Em menos de uma década, temos dois presidentes presos, e ainda assim a reação coletiva se resume a comemoração do “lado A” ou do “lado B”. Não se trata de política, nem de um país melhor. Trata-se de idolatria. De uma ilusão de que um brasileiro precisa odiar o outro para validar sua própria visão de mundo. Um lado não presta porque endeusa o outro, e vice-versa. Nossos representantes, que deveriam unir, alimentam o ódio com discursos vazios de paz e de conciliação. E nós, cegos pela polarização, seguimos divididos como irmãos em guerra, incapazes de enxergar que o verdadeiro problema não está apenas neles, mas em nós mesmos.

Quase uma oração

Tenho trabalhado muito minha mente para desconstruir aquilo que enraizaram no meu subconsciente: a ideia de que, como professor, devo mudar o mundo ou reparar o descaso que parte desta geração tem pela educação. Não sou salvador da pátria, nem herói. Sou um profissional formado e capacitado para ensinar. Na faculdade, não me ensinaram a sacrificar minha saúde física e mental para convencer os alunos de que precisam ser estudantes. Meu compromisso é dar o melhor de mim àqueles que desejam aprender. Esses merecem meu esforço. Quanto aos demais, que colham o que plantaram. E quando tentarem me culpar pelo fracasso, minha meta é não me deixar abalar e ter a clareza de que estive em sala de aula por todos, mas que nem todos estiveram lá para aprender. Quando os pais vierem reclamar, culpar-me e colocar os filhos em altares invisíveis, que eu tenha a sabedoria de dizer o que precisa ser dito: durante um ano inteiro não se preocuparam com a vida escolar deles, e agora precisam colher, junto c...